O ano de 2020 foi marcado por novidades e transformaçÔes que surpreenderam a maioria das pessoas. Entre as mudanças, a SĂndrome do Impostor apareceu ou reapareceu em muitos cenĂĄrios. VocĂȘ sentiu?
âVamos fazer um exercĂcio de imaginar que vocĂȘ foi promovido no seu trabalho. Em vez de comemorar a tĂŁo almejada promoção, a Ășnica coisa que vocĂȘ consegue pensar Ă© que ela sĂł ocorreu por pura sorte e chega atĂ© a questionar se suas habilidades atuais condizem com o novo cargo, sem reconhecer o seu merecimento.â
Quem ilustra essa situação Ă© a professora Denise de Moura, dos MBAs USP/Esalq. âEsse padrĂŁo de comportamento profissional, de pensar que, a cada conquista, logo uma estupidez ou fraqueza serĂĄ descoberta, constitui um modelo mental em que os sentimentos de alegria sĂŁo abafados pela sensação de falsidade ou fraudeâ, completa.
Outros cenĂĄrios tambĂ©m caracterizam a SĂndrome do Impostor. âMesmo atingindo metas altas, vocĂȘ se sente fracassado, se questiona se estĂĄ fazendo a coisa certa ou se autossabota constantemente? VocĂȘ se cobra demais e exige perfeição em todos os aspectos da sua vida? E, como estamos em constante evolução e erros e acertos fazem parte desse crescimento, vocĂȘ vive frustrado e muito estressado? EntĂŁo Ă© hora de acender a luz amarelaâ, exemplifica Denise.
Conhecendo um pouco mais da SĂndrome do Impostor
Como o prĂłprio nome diz, essa sĂndrome faz vocĂȘ se sentir um impostor. âVocĂȘ se sente uma fraude e nĂŁo se percebe merecedor das conquistas que alcança. Isso gera frustração, estresse, falta de autoconfiança e pode, ainda, catalisar uma depressĂŁoâ, alerta a professora.
De acordo com Denise, alguns fatores podem auxiliar no desenvolvimento da SĂndrome do Impostor, como:
- Traços de personalidade
- HistĂłricos familiares
- Necessidade de ser amado e respeitado ao extremo
Na histĂłria
Quando os estudos sobre o tema começaram, por volta da dĂ©cada de 1970, pesquisadores atribuĂam essa sĂndrome Ă s mulheres. âDuas pesquisadoras da universidade do estado de GeĂłrgia, Pauline Rose Clance e Suzanne Imes, publicaram um artigo, em 1978, intitulado âThe Imposter Phenomenon in High Achieving Women: Dynamics and Therapeutic Interventionâ (O fenĂŽmeno do impostor em mulheres de alto desempenho: DinĂąmica e intervenção terapĂȘutica)â, destaca Denise.
Apesar do artigo ser direcionado somente Ă s mulheres, focando em questĂ”es familiares, alta cobrança por resultados e no machismo como possĂveis causadores da SĂndrome do Impostor, a professora ressalta que, hoje, ela atinge todos os tipos de pessoas, gĂȘneros e profissĂ”es.
Lidando com a SĂndrome do Impostor
âSĂndrome do Impostor Ă© o oposto da atitude que precisamos ter neste momentoâ, diz Carol Shinoda, tambĂ©m professora dos MBAs USP/Esalq. âEla nos traz uma falta de capacidade de interiorizar nossas conquistas e de reconhecer que temos um papel ativo e somos responsĂĄveis por nossas realizaçÔesâ, enfatiza.
E quando passamos por momentos em que o nosso entorno estĂĄ cheio de obstĂĄculos e dificuldades, Carol aponta para a necessidade de olharmos para nĂłs e reconhecermos nossas habilidades de transformar, de correr atrĂĄs do que queremos e de superar.
âNĂŁo Ă© simples e o processo de reconhecimento de nossas capacidades Ă© longo. Eu mesma tive um processo longo de reflexĂŁo e terapia para perceber, por meio de fatos e dados, que teve indicação, ajuda e apoio de outras pessoas para chegar aonde estou, mas tambĂ©m teve a minha parte, a minha entrega, que me manteve aonde chegueiâ, exemplifica a professora.
Ninguém vive sozinho
Receber ajuda e orientação nĂŁo faz de nĂłs uma fraude. Pelo contrĂĄrio. Uma rede de apoio Ă© essencial para nossa vivĂȘncia e sobrevivĂȘncia em sociedade.
Por isso, depois de reconhecer a SĂndrome do Impostor e tentar analisar como essas crenças infundadas de incompetĂȘncia prejudicam nossa vida pessoal e profissional, a dica da professora Denise Ă© contar com um amigo ou mentor para vigiar os momentos de autossabotagem.
âReceber feedbacks corretivos e positivos traz reflexĂ”es sobre comportamentos e crenças limitantes, que podem desencadear a anĂĄlise e o desenvolvimento da autoconfiança e de um modelo mental que tem orgulho das pequenas conquistas e faz disso um hĂĄbitoâ, explica Denise.
Para Carol, a relação Ă© dialĂ©tica: âNossas conquistas contam com o apoio das pessoas Ă nossa volta, que nos ajudam, nos impulsionam e nos dĂŁo oportunidades. Mas, no fim do dia, quem realiza e se mantĂ©m somos nĂłs. Precisamos dos outros, ninguĂ©m vive sozinho, mas tambĂ©m precisamos nos empoderar das nossas capacidades e da nossa histĂłria, reconhecer que construĂmos muitas forças ao longo da nossa trajetĂłria e, com isso, quando tivermos novos desafios, jĂĄ temos alguns recursos para colocar e superar novas barreiras.â
Vamos Ă s dicas?
Se as metas altas podem provocar sentimentos de incompetĂȘncia, que tal começar com metas mais simples? Denise ensina: âA cada alcance, comemore e veja que seu esforço e dedicação contribuĂram com esse sucesso. NĂŁo foi por pura sorte. Trabalhe a confiança em si prĂłprio e tenha orgulho da pessoa que vocĂȘ Ă©. Tudo isso ajuda a mitigar as crenças limitantes que favorecem a SĂndrome do Impostor.â
TambĂ©m vale escutar com atenção os elogios que recebe. âVeja quais se repetem e quando. Assim, procure aprimorar, com constĂąncia, esses pontos fortes. Isso tambĂ©m ajuda no desenvolvimento da autoconfiançaâ, diz Denise.
Carol comenta, ainda, que a SĂndrome do Impostor tem um oposto. âO Efeito Dunning-Kruger Ă© o que faz com que a gente nĂŁo reconheça nossos limites e incapacidades. E isso tambĂ©m Ă© um perigoâ, reforça.
Construindo relaçÔes
Todos estamos suscetĂveis Ă SĂndrome do Impostor e a nĂŁo reconhecer nossas prĂłprias capacidades, especialmente em momentos de pressĂŁo e dificuldades externas. âSe nĂŁo estivermos fortalecidos internamente, ficamos mais vulnerĂĄveis. Vale lembrar sempre dos nossos momentos de dificuldades e de quem nos ajudou a superarâ, aconselha Carol.
Ela cita recursos internos e externos, como famĂlia, amigos, rede de apoio e de contatos. Mas faz uma provocação: âEsses fatores sĂŁo internos ou externos? SĂŁo externos porque estĂŁo fora do nosso corpo, mas sĂł existem porque hĂĄ uma relação entre mim e eles, entre nĂłs.â
Apesar da SĂndrome do Impostor revelar uma questĂŁo muito Ăntima nossa, relacionada Ă capacidade, isso Ă© sempre feito num contexto, jĂĄ que ninguĂ©m vive em uma bolha, em um mundo separado e idealizado. âVivemos em um mundo cheio de limitaçÔes, obstĂĄculos e potencialidades. Ă nessa navegação de contexto que construĂmos nossa realidade, mas quem dirige esse barco somos nĂłsâ, conclui Carol.
VocĂȘ jĂĄ conhecia a SĂndrome do Impostor? Compartilhe suas experiĂȘncias!