O fact-checking Ă© uma checagem de fatos, um instrumento de conferĂȘncia da verdade noticiada na internet. A ferramenta ajuda a confrontar histĂłrias a dados, pesquisas e documentos, qualificando o debate pĂșblico por meio da apuração, como nos casos de acusaçÔes a candidatos polĂticos ou sua credibilidade antes e durante o perĂodo das eleiçÔes.
Mas, afinal, como uma agĂȘncia de fact-checking trabalha e de que forma ela consegue confirmar a veracidade dos fatos entre tantas notĂcias falsas?
O Next conversou com Douglas Silveira, gerente de marketing da agĂȘncia Lupa, uma das Ășnicas exclusivamente dedicadas a fazer o serviço de checagem e a primeira a se especializar na tĂ©cnica jornalĂstica no Brasil.
A era da desinformação
Antes da existĂȘncia das redes sociais, as notĂcias de veĂculos tradicionais, como jornais impressos, revistas, televisĂŁo e rĂĄdio, eram exclusivamente produzidas e apuradas por profissionais do jornalismo. Atualmente, elas circulam de maneira mais fluĂda e rĂĄpida, sendo muitas vezes replicadas sem uma anĂĄlise do conteĂșdo e podendo conter algum grau de inverdade ou exagero.
Nesse contexto, surgem as agĂȘncias especializadas na checagem de informaçÔes. A proposta faz uma reinvenção do jornalismo para confirmação a autenticidade das informaçÔes, apontando dados inflados ou ocultados que possam afetar a opiniĂŁo ou senso crĂtico pĂșblico.
As agĂȘncias agem como um novo canal, uma alternativa para recorrer e se informar melhor antes da tomada de decisĂ”es, sejam elas simples ou de importĂąncia coletiva.
Nasce uma checagem
Tudo começa com a observação diĂĄria de todos os veĂculos da mĂdia que possam ter informaçÔes a se checar, incluindo redes sociais e a internet como um todo. Neles o jornalista – chamado tambĂ©m de checador – vai se inteirar sobre o que as pessoas de relevĂąncia social estĂŁo falando e assuntos que tenham gerado destaque na mĂdia. Essa Ă© a matĂ©ria-prima de toda agĂȘncia de fact-checking.
O tempo entre o rastreamento de uma notĂcia que precisa de checagem e a publicação da apuração pode levar de horas a semanas, dependendo da complexidade do fato. Silveira explica que a preocupação Ă© sempre fazer os mĂ©todos de forma rĂĄpida, mas lembra que uma boa checagem vale mais que um furo.
âA pressa de publicar uma notĂcia ou furo nĂŁo Ă© muito a praia da Lupa, porque trabalhamos com informaçÔes ditas previamente. Achamos mais valioso e correto segurar a informação atĂ© que ela esteja robusta e com uma apuração bem-feita para o leitorâ, conta Silveira.
Detectando mentiras
Checagem exige faro. Ă o que afirma o gerente em relação ao trabalho dos repĂłrteres, que costumam identificar uma notĂcia com aparĂȘncia de falsa em uma primeira leitura. âA constĂąncia do trabalho utiliza ferramentas e um banco de dados para comprovar as informaçÔes apĂłs issoâ, ressalta.
Segundo Silveira, as agĂȘncias de fact-checking nacionais sustentam um trabalho mais artesanal em comparação aos checadores internacionais que jĂĄ tĂȘm a tecnologia da informação associada ao trabalho do jornalista, como as plataformas PolitiFact, dos Estados Unidos, e o El Objetivo, principal veĂculo de checagem da Espanha.
âNĂłs ainda nĂŁo temos ârobĂŽsâ que facilitem nosso trabalho de pesquisa, mas conseguimos dar conta sabendo que a melhor forma de combater notĂcias falsas Ă© com mais informação, mesmo que isso represente mais procura e conhecimento das ferramentas disponĂveis para chegar ao fato checado.â
Fake News = Boataria
A Lupa nĂŁo usa mais o conceito Fake News. Silveira justifica o âdesapegoâ do termo devido a sua banalização. âEntendemos que se Ă© notĂcia ela necessariamente foi checada e apurada, entĂŁo Ă© um contrassenso falar de notĂcia falsa tendo em vista que a prĂłpria essĂȘncia do trabalho do jornalista jĂĄ requer uma apuração. O que existe sĂŁo falhas e exagerosâ, conta.
Por outro lado, ao optar por nĂŁo utilizar o termo Fake News, a agĂȘncia nĂŁo cai na usualidade dele como adjetivo, principalmente por pessoas que nĂŁo sĂŁo a favor de um texto.
âVirou uma forma de atacar jornalistas. A gente fala mais que Ă© uma boataria, atĂ© mesmo porque a Fake News surge como tradução literal da notĂcia falsa, uma desinformaçãoâ, disse o gerente.
Fontes devem ser pĂșblicas
Na era da pĂłs-verdade, em que crenças e opiniĂ”es pessoais prevalecem sobre a informação, o trabalho de uma agĂȘncia de fact-checking se torna ainda mais importante ao instigar o leitor a participar da apuração de uma notĂcia. Para isso, os repĂłrteres da Lupa utilizam hiperlinks em todas as fontes utilizadas, comprovando o que estĂĄ na afirmação e dando oportunidade para a quebra da opiniĂŁo formada.
âTemos uma polĂtica extremamente clara e Ă©tica com o nosso leitor, mas a dificuldade Ă© lidar com pessoas de opiniĂŁo polarizada que acreditam apenas no prĂłprio interesse como verdade. NĂŁo somos donos da verdade, pelo contrĂĄrio, entendemos que ela nunca estĂĄ no mesmo lugar e com todo mundo. Temos que buscĂĄ-laâ, observa Silveira.
Imparcialidade Ă© necessĂĄria
Todo cidadĂŁo tem opiniĂŁo, inclusive os jornalistas da Lupa. O trabalho dentro da agĂȘncia de fact-checking, entretanto, exige que nenhum ideal ou opiniĂŁo esteja acima da função do repĂłrter ou dos cincos princĂpios Ă©ticos da agĂȘncia, que inclui o apartidarismo na apuração.
âMuitos apontam nosso trabalho como tendencioso. Uma hora somos taxados como representantes da esquerda e em outros momentos como da direita. Internamente dizemos que se isso acontece Ă© porque estamos cumprindo o nosso papel.â
Todos sĂŁo checadores de notĂcias
Se por um lado o trabalho da agĂȘncia de fact-checking incomoda determinado pĂșblico, por outro ele instiga o leitor a nĂŁo ser passivo em presença de qualquer informação, inclusive a que aparenta veracidade.
Mesmo diante de erros que possam ser cometidos durante a checagem, o que prevalece na redação Ă© a transparĂȘncia, entĂŁo o leitor pode checar o checador e contribuir com o texto, indicando novas fontes, documentos, informaçÔes complementares e, tambĂ©m, erros.
âSer um checador Ă© para todo mundo. O que a gente quer e entende Ă© que a propagação de notĂcias falsas Ă© cada vez maior e a melhor forma de se combater isso serĂĄ com mais informação e educação. Promover isso entre a população, se conseguirmos, vai mostrar que a Lupa fez um grande trabalho. Ă assim que tentamos melhorar a qualidade do discurso no Brasilâ, ressalta o gerente de marketing.
Ao receber crĂticas de opiniĂ”es polarizadas, a agĂȘncia mostra ao leitor como foi realizada a apuração que rotulou a matĂ©ria como falsa ou nĂŁo, que vai desde a comprovação de uma informação falsa atĂ© o monitoramento para saber se, no futuro, ela pode vir a ser verdadeira. ApĂłs conferir o passo a passo utilizado pelo jornalista e observar que existe um erro, ele pode sinalizar para que a agĂȘncia faça a correção.
VocĂȘ costuma fazer algum tipo de checagem das informaçÔes que lĂȘ na internet? Conte para nĂłs! ?